O ano era 2016
Eu atravessava a rua
Pra pegar o 513L-10
Quase sempre atrasado
Eu e o transporte
Quase nunca rejeitado
Mesmo quase sem sorte.
A sorte era tua
De ter esse zero à esquerda
Sempre com nova queda
Largando moeda
Pra te ver no cinema
A janela era pequena
De tempo e visão
A gente num esquema
Já tocava o coração
Pra quem seguia o lema
Álcool, rap e pegação
Você burlou meu sistema
Virou a única opção
Agora anos se passaram
E já não somos conhecidos
Passaram e se acabaram
Meus tempos destemidos
Contudo, contundido
Esperanças afogadas
Respiro num mar de derrota
Um idiota de anedota
Sem caminho, sem rota.
É assim que
se inicia o trabalho que eu considero o musicalmente mais relevante do ano de
2018. O EP
‘Espelho’ tem 16 minutos e um documentário de 9min,
uma obra total de 25min. Drik Barbosa pôs seu melhor em 5 faixas, passando
desde temáticas pessoais até estruturais, começando em um som orgânico e chegando
no trap, sem deixar em momento algum de ser o melhor do RAP e R&B.
Como
sempre, acho melhor dar uns passos pra trás antes, para que faça mais sentido o
porquê desse trampo tão pequeno ser relevante e extremamente importante.
Aos 25 anos, ela coleciona versos destaque e refrões ultra melódicos, uma das melhores vozes da música brasileira atual. Com pouco mais de 32 colaborações (cyphers, feats e etc), ela já está na caminhada há tempos. Desde 2007 ela já é chamada para cantar em discos[1] de músicos como Flow MC, Marcelo Gugu, Dj Caique, Emicida e etc. Conheci-a em Mandume, que integra o 2º disco do Emicida. Ela abre esse som com maestria, recheia o verso com referências sensacionais, punchlines agressivas e postura condizente. Conforme ela participou de projetos como o Poetas no Topo 3.1 e o Poetisas no Topo, conheci um lado mais melódico e mais rimas espetaculares. Em 2017 ela também integrou o projeto Rimas & Melodias, que lançou um álbum sólido. Ela está, já a um tempo, nos holofotes do rap nacional, sendo requisitada pra projetos e projetos, representando as minas bem demais.
Tendo em vista essa recapitulação da caminhada da Drik até agora, fica muito claro que quando o G1 a coloca no título da matéria como revelação, a falta de consideração por toda a caminhada anterior é evidente. E também por isso, ela lançar um EP depois de 11 anos de carreira é chamativo.
As músicas que
compõe esse trabalho são, na ordem na qual aparecem:
Existem milhares de maneiras de
dizer a mesma frase. Modificar a ordem de certos termos numa frase, usar
sinônimos, adicionar e/ou remover palavras (dentre muitos outros instrumentos
da Língua) são ferramentas que te permitem expressar ideias iguais de maneira
diferente. Expandindo um pouco o uso das mesmas ferramentas, dá-se por exemplo
a passagem de duas mensagens com frases parecidas. Ou mensagens completamente
diferentes com expressões diferentes. Enfim, o meu ponto é que o Português, por
si só, já é extremamente versátil e comporta muitas formas de comunicação.
Imagine misturar essa versatilidade
à arte. A imensidão de sentidos e maneiras gera um vão para olharmos e compararmos
como se diz e porquê.
Por isso que hoje, quero falar de
sobre uma imagem poderosa. Eu não sei exatamente o porquê ela é tão forte, por
quê causa um certo desconforto inconscientemente. A imagem aparece em 5 vídeos
do Rap nacional- ‘O Que Separa os Homens dos Meninos’, Sant; ‘Crime Bárbaro’,
Rincon Sapiência; ‘CORRA’, Djonga; ‘Bluesman’, Baco Exu do Blues; ‘Deus do
Furdúncio’, BK- de maneira similar: a imagem de um homem, negro, correndo.
Não culpe os velhos Eles só esqueceram Que o mundo vai além Desse utilitarismo proposital De ordem e progresso O positivo é letal Pros que podem, avanço Pros que morrem, regresso
Os velhos se esqueceram Que o mundo se sente, Antes de se ter.
A minha vida é uma gritaria de acontecimentos
Mas é o teu silêncio que me ocupa
É um monte de fonemas,
Palavras sem ordens exatas
E a tua reticiencia me enlouquece
Você é a pausa numa f(r)ase incompleta.
Não falo simplesmente da esquerda partidária, que sucessivamente tem sido “surpreendida” nas urnas, mas sim de nós, humanistas. Não deveria ser considerado ‘de esquerda’ apoiar direitos humanos, mas, neste momento, é. O feminismo não deveria ser ‘de esquerda’; mas é. Lutas raciais, antifascismo e muitos outros movimentos deveriam ser mais sobre igualdade, mas não. E por isso que perdemos.