Textos, em geral, reflexivos e sempre curtos, de leitura rápida.

A ousadia é uma amiga íntima da felicidade

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Nunca é tarde pra tomar decisões.

Quando era mais novo, pensava mais imediatamente que hoje, ainda novo. Porém, agora, talvez num relapso de lucidez que vai me deixar tão rápido quanto demorou pra chegar, vejo que não há tempo melhor pra voltar atrás do que agora.

Não sou arrogante de afirmar que não há arrependimento que requer aceitação plena e um tanto de angústia, mas tenho certeza que estas são minoria, pequenas atitudes dentro dum oceano de possibilidades. Num dia só já são tantas… do despertar ao piscar de olhos anterior ao sono somos cercados inteiramente por escolhas, e amiúde tomamos as coisas como dada.

Por exemplo, um homem pontual sai de casa, e ao chegar no ponto de ônibus nota que esqueceu o guarda-chuva; o dia está nublado, as nuvens cinza-escuras e o cheiro de terra molhada conta uma história por si só. Neste momento, ele só pega o ônibus e volta molhado para casa ao final do dia. Ele aceita, logo ao início do dia, que ser pontual é natureza dada, e portanto o guarda-chuva esquecido é incompatível e não merece consideração. Ele não vê que tem a opção de chegar 10 minutos atrasado no trabalho para ao final do dia não se molhar. Decidiu sair de casa pontualmente, decidiu entrar no ônibus, e ao final do dia se arrependeu de não pegar o guarda-chuva.

O leitor atento dirá que ao final do dia era tarde para pegar o guarda-chuva, e para isso respondo: no dia seguinte, quando estiver no ponto novamente, ele terá a mesma escolha. E novamente irá escolher a pontualidade, para se frustrar ao final do dia. E então não será tarde, mas sim o momento certo.

Somos livres para escolher nossos venenos, seja ele a chuva no ombro ou a bronca do chefe, a dor da rejeição ou a angústia do segredo, a insegurança do novo ou a monotonia do velho, o tesão da incerteza ou a calmaria do constante. 

A ousadia é uma amiga íntima da felicidade, e o ousado quem sabe está dois passos mais longe na maratona da alegria.

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Terra da Garoa

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  • Tempo de leitura:2 minutos de leitura

Hoje choveu garoa na cidade de São Paulo e, meu amor, senti que a cidade voltou ao seu natural de tristeza que não te vi.

Fazia tempo que a metrópole não se rendia à moda antiga, deixando (por uma tarde) de lado as tempestades ou secas modernas.

Quando senti o sereno no rosto, veio calma advinda de um outro tipo de nostalgia. Era saudade. De uma neblina fraca, mas atrapalhando o olhar, comparado com a visão, de uma rotina que, apesar de nunca tida, eu abandonaria com você.

O amor que tenho por você é semelhante ao amor a deus; acredita-se na existência e defende-se com tudo algo que, pela falta de matéria, é pouco mais que (ou somente) uma idéia. O amor que espero de ti é como o temor da morte; imponente, algo só pensado quando se chega perto. Quero que sejas minha viúva, sem morte ou casamento, e, olhando essa garoa caindo do céu paulista, veja nela as lágrimas, não choradas pela minha não-morte, e o não-luto seja eterno. As lágrimas que espero de ti são como flocos de gelo: frios, escondidos quando sós e claros na abundância. Que venham numa mudança brusca de calor em ti e, por um instante, percebas a falta que lhe faz meu calor.

Choveu hoje e, ao fechar um pouco os olhos para ver melhor, decidi tirar o capuz e sentir a água caindo.

Lembrei de como contei da natureza mágica da chuva, como aparecia nos meus maus momentos e lembranças. Sentindo as gotículas na nuca, tentei buscar em mim o ruim ativador da chuva e vi como sentia sua falta, mesmo te vendo todo dia (quase), pelo fato (em pouco tempo) não mais lhe ver. Não te peço para esperar, meu amor.

Só lhe peço para, quando São Paulo resolver garoar, lembrar-se de mim.

L.Giannoni

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Desabafo acerca dos meus lugares

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  • Tempo de leitura:1 minutos de leitura

Me sinto num dilema entre entrar de cabeça numa sexualidade e me sentir explorando um espaço que não é meu. Porque ele nunca foi meu de fato.
Mas ele é meu. É parte de mim. Seria loucura fingir ser diferente do que sou por medo de apropriar, sendo que esse espaço me tange. Eu não devo nada a quem não via, eu não me devo nada além de exercer minha personalidade da maneira mais confortável possível.
Se isso significa ser mais que pareço, que pareça mais. Se significa parecer mais que sou, é uma escolha válida e minha.
Posso. Vou. Serei.

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Uma pena

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Se não bater as asas, o pássaro cai.
Se bater fraco, ele se mantém.
Se bater forte, ele vai subir.
O pássaro, em momento nenhum, sai do nível que quer. Isso faz parte da liberdade do pássaro; ele sempre sabe quão alto ele quer estar, qual caminho ele deve seguir. Quase nunca você vai ver pássaros se batendo no céu, afinal, as nuvens não ocupam espaço, logo, não há porque brigar por este.
Mesmo assim, pássaros não voam todos no mesmo nível. Uns voam mais baixo, uns mais alto- outros, nem voam- e são felizes assim.
Eu queria a liberdade dos pássaros.

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A tua imagem

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Você é uma daquelas pessoas que eu sempre olhei de longe, ficava pensando como a gente daria certo. Daquelas de olhar foto e ver que a cor dos nossos olhos se balanceia e que seríamos fotogênicos.
Na verdade, quando via seu feed, percebia como eu podia ser bom pra você; tanto ali, no social, quanto no pessoal. Temos os mesmos interesses mas não temos nada em comum.
Eu sempre vi você e pensei como eu seria um bom namorado, melhor do que qualquer um seu até agora. Eu ia dormir na sua casa e te levar café na cama. Mesmo que todos fizessem isso, o meu é diferente. Eu desenho um coração, suas iniciais, um passarinho defeituoso na crema no expresso. Eu faço expresso. Eu pegaria textos e decoraria pra você.
Eu sempre achei que daríamos certo, mas nunca acertei se dá pra eu ser feliz.

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Hospita-lar

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Te quero ao meu lado porque tu tiras uma dor enorme do meu peito. É como um soro injetado na minha corrente sanguínea, removendo o mal estar.
Minha dúvida é se és morfina ou remédio. Tiras neutralizando ou atacando a causa? És tu, bem-amada, um paliativo ou cura?
Ainda não descobri, mas quero-te desde o acordar ao adormecer. Em ambos casos, me fazes bem.

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Uma gota de grafite num iceberg de papel

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  • Tempo de leitura:2 minutos de leitura

Me parece que o tempo, cada vez mais, mais tira certezas do que as confirma.

Eu, que sempre cultivei amizades ao invés de coleguismos- me rendendo uma vida por vezes solitária-, julgava estas primeiras dignas pela profundidade de conversas e idéias, como se colegas não fossem dar a mim aquilo que busco: inspiração e conforto.

Errei. Errei feio.

O escoamento dos minutos tem me mostrado que conexões rasas dão às vezes conversas frutíferas, e também vejo que amizades profundas podem dar muita asneira no papo. Nada contra isso, claro. Mas me surpreende ver rios, possíveis de acabar no oceano (ou um mar, sem problemas) desaguem em lagos ou talvez sequem, enquanto uma poça pode terminar numa geleira.

É possível sentar-se na mesa de um bar e, por um comentário descuidado, não pensado e certeiro, começar uma troca de idéias muito (mesmo) grande e profunda. É possível nunca mais falar com a pessoa após, mas as palavras ficam.

Na falta de rios, poças e lagos na madrugada, me reporto ao papel, chuviscando estes humildes pensamentos. Uma gota de grafite num iceberg de papel.

-R.C.

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Princípio ativo da atração

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Acho que é comecinho de paixão isso que sinto.
Um tipo de esperança… mas não se sabe o que, porque se espera. Só sei que é um acordar bem sem muito saber do destino mas ter rota traçada para os braços de alguém.
Ter vontade de ver mesmo só tendo visto duas vezes, beijado uma e, apesar desse freios, conversado milhares. De que vale contato físico sem intelectual? E contato social sem vontade? A distância promove o proibido.
Talvez pela juventude ou pela ânsia por liberdade, sempre fui correndo atrás do proibido- mas nunca foram pessoas, sim atos. Essa contra-norma me atrai tanto…
Contra-normas sociais pela atitude, contra-normas mesmo cheio destas.
Façamos assim: não se pode mentir olhares, independente de qual encontro se encontra. Os seus (tão lindos e contemplativos, metalinguagem com os meus, quem sabe) me pareceram apaixonados sem saber nem poder, escondendo-se pela dona ser tal Contra-norma.
Minha norma era não mais se apaixonar mas, de pouco a pouco, é isso que acho que sinto.

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Terror urbano

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Após o enorme sucesso dos super-heróis a vigilância tomou conta das ruas das cidades. Acabou-se com privado, vive-se na era das câmeras.
Passando pelas casas, todas tem o olho mágico digital, tornando segura a entrada e saída do lar, prevenindo assaltos e vandalismos.
Claro, também revela acontecimentos nunca antes vistos, como o casal se agarrando ao lado do portão, inofensivo, anteriormente infalseável se aconteceu ou não. Revela o escritor conversando sozinho na rua escura.
De carro, cá no centro, encontram-se os seguranças eletrônicos. Impedem invasões, assaltos a queima roupa, roubo de carros e de vendas.
Também ajuda a esconder a droga quando a polícia vai passar, caso entre para fazer revista. Ajuda a tapar a boca da criança sequestradas que tá no porão.
No topo de cada prédio tem um observador oculto, que ajuda em todos os eventos acima.
Porém, ela não só observa. Ela também faz circular.
Circula opressão pela vigilância. Circula o medo de ser pego fazendo nada demais. Circula o medo de ser mal entendido em um ato e ir a cana por isso. Circula o medo de ser o próximo alvo da violência, e isso lhe faz colocar mais uma.
E outra do lado oposto.
Mais uma dentro de casa, a empregada pode estar roubando.
A criança pode ser drogada, coloca ali pra ver o que ela faz.
O cônjuge pode estar traindo, no quarto também.
Hackeia a do celular, nunca se sabe pra onde está a essas horas… fala de trabalho mas pode estar na farra.
Ponha uma em mim também, será que mexem comigo de noite?
Uma na bolsa, talvez tenham me roubado e nunca iria perceber, mesmo olhando por todas as outras.
Ponha uma nas cabeças, vamos descobrir quem pensa coisa errada e punir.
Parece que agora todo mundo é uma câmera, e nem tem mais como se esconder.

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Amor em SP- As crônicas de um fotógrafo

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Fotógrafo- Victor Dragonetti
Solitário é o sanfonista que, com muita boa vontade, solta notas a um casal. Eles, sem dó ou rétenção de suas vontades, se beijam só esperando.
Solitário é o homem, que ama a garota, mas espera o ônibus que a leva longe, onde sua menina geralmente está, deixando-o sem seu espírito.
Solitária é a garota, que não tem a coragem de contar a ele a verdade, e acabar com algo gostoso, mas temporário, pois espera o sentimento certo, não encontrado nele. Sente que perde tempo, assim como vai perder o ônibus na sua frente e nunca esquece isso.
Solitária é a outra garota, observando o casal beijando, tentando desviar o olhar e esquecer que ele pertence a outra. Possivelmente, ela está enganada, mas o olhar dele quase elimina a possibilidade: o amor nunca deixou o coração dela e sozinha sempre esteve desde que ele partiu, para estar com outra.
O mais solitário é o fotógrafo, que, apesar de não sentir nenhum dos sentimentos citados, quer sentí-los mais que tudo, mas a única coisa que pode fazer no momento é pegar sua câmera e recordar esse momento de complexidade sentimental paulista.
Porém, a maior dor é a do poeta, prosando em cima desse momento pois, para isso, ele sentiu na própria pele a solidão de observar um momento, a de ver um amor se distanciar, de não estar com um amor, de perder um amor e de desejá-lo intensamente.

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